Antes mesmo que eu soubesse, de forma consciente, eu já havia me lançado ao TFG. Foi no primeiro ano de faculdade, quando morava em frente ao campus, num apartamento com vista pra algumas árvores e testada voltada para uma avenida remota aos finais de semana, que surgiu um pequeno lapso do futuro-tema. Imerso num recente distanciamento do familiar — inclusive interior — que despretensiosamente busquei “arquitetura da solidão” no Google. Não lembro bem agora a ordem dos links, mas foi na primeira página que encontrei um artigo intitulado “Arquitetura e Solidão: John Hejduk em Berlim”, por Laís Bronstein Passaro, na revista Risco do IAU-USP.
Embora a minha ânsia fosse mais focada na questão da solidão associada à minha extremamente recente escolha de graduação do que de fato na arquitetura, soergueu-se do artigo a percepção nada acurada da presença de uma narrativa que permeava os projetos, seus títulos e sobretudo, os desenhos.
Os bosquejos por assim dizer — pelo modo despretensioso e “grosseiro” de representação — carregavam boa parte do que a realidade não era tão capaz de acolher. Os traços repetidos diversas vezes, na mesma direção e sobrepostos, reforçando limites e sombras, gritavam sobre uma inquietude.
Questões como alinhamento, escala, número de unidades residenciais, tipologia e concordância com os padrões edilícios do local são simplesmente ignoradas na construção singular de personagens-objetos-estruturas relacionados por uma realidade própria.¹
Ainda que o artigo falasse especificamente de projetos que Hejduk submeteu a concursos em Berlim, foi possível perceber, aos poucos, que havia algo de não-dito em suas propostas, que necessitava de uma pausa maior, talvez de um silêncio mais longo. Mais adiante eu voltaria ao mesmo artigo com outra visão, mas por enquanto o que tinha me fisgado era ver a possibilidade da criação de uma outra realidade dentro da nossa realidade. Algo entre a fuga neurótica e o massacre cotidiano.
Depois dessa descoberta, parti atrás de encontrar mais sobre esse arquiteto, morto em 2000, aos 79 anos, integrante atarracado do New York Five e com mais plantas e rascunhos no Google Imagens do que fotos de suas construções em ângulos favorecidos. Em vão. Um ou outro artigo ou publicação em português, textos fatiados em inglês e nomes de livros sem tradução e fora de catálogo. Num gesto despretensioso procurei “John Hejduk” no campo de busca do Estante Virtual. 1 livro usado em 1 vendedor. Mask of Medusa. Pensei duas vezes, já que era o equivalente a uns 4 meses de xerox na faculdade, e na terceira comprei.
Foi a chance. Um livro que reunia seus trabalhos e projetos, bem como entrevistas, textos e poemas, desde suas primeiras explorações, até os últimos projetos. Tentei logo de cara começar uma leitura, mas meu inglês e o segundo ano de arquitetura não me davam tanto embasamento pra que eu investisse numa pesquisa pesada. Após um período de 3 anos abri o livro com novas mãos e comecei a perceber suas conexões com outros temas; suas argumentações legadas a um relativo esquecimento; suas alegações, confusas e bruscas, embebidas em um certo peso dramático.
Apesar da abordagem messiânica que pareça existir, proponho nada além de uma chave interpretativa, a partir do estado de solidão, identificável ao longo das produções de Hejduk e suas investigações no decorrer da vida — objetos que buscarei explorar — e que doto de importância pela singularidade de sua apresentação, mas sobretudo pelo valor apresentado.
Com isso, inicio de maneira um pouco mais oficial a fronteira final da graduação, o TFG. Continuarei as postagens com aquilo que acho pertinente ao tema, mas sem (tanto) rigor acadêmico, ainda que fruto de leituras acadêmicas.
notas
¹ LAÍS BRONSTEIN PASSARO. Arquitetura e Solidão: John Hejduk em Berlim. Revista Risco, São Paulo, n°1, Artigos e Ensaios, 44–48, fevereiro, 2003. Disponível em: <https://www.revista s.usp.br/risco/index>.
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